Absoluta mente
Tudo isso é muito relativo

“Se creio em Deus?
Não, creio em algo… muito maior”.
(Umberto Eco, citando um dito atribuído a
Rubinstein).
Vou lendo aos poucos um
livro de Umberto Eco (Aos ombros de gigantes,
Gradiva, 2018). Leio devagar e páro
frequentemente para pensar. E volto atrás e
releio um capítulo (o quarto, na ordem, já que
não são numerados) chamado Absoluto e Relativo.
O que se segue é mais ou menos o que me acontece
no espaço de uma entrelinha. Os percursos da
mente são tramados. Não há sentidos proibidos,
cancelas, barreiras… O espaço e o tempo são
galgados num voo imparável…
É
relativamente comum ouvir-se dizer “Ah, isso é
relativo!”, ou até “Tudo isso é muito relativo”.
Parece que isto tem a ver com o Einstein.
Provavelmente é verdade, mas também é provável
que não seja bem pela razão que a maioria das
pessoas que usam estas expressões julgam. Sem
nunca ter lido uma linha escrita por Albert
Einstein, um grupo de adolescentes, com arrogos
de intelectualidade, discutia o que julgava ser
a Teoria da Relatividade quando na verdade o que
acontecia era um fascínio quase erótico pelos
paradoxos emergentes (um dia voltarei a este
soberbo enunciado) que misturava física com
filosofia e confundia a relatividade com o
relativismo. Dizer que “tudo é relativo” era
assim uma espécie de moda a que não se escapava
apesar daquele espinho contraditório cravado à
nascença naquela declaração absoluta. Mas isso
não assustava aqueles adolescentes de há quase
cinquenta anos e rapidamente a formulação evolui
para “tudo é relativo, incluindo esta
afirmação”. Depressa alguém se apercebeu do
carácter também absoluto desta afirmação e deve
ter sido por isso que começamos a interessar-nos
por outros temas e alguns de nós até se
encontravam amiúde num certo “baile de garagem”
que, por acaso eram num sótão transformado em
boite.
Pouca gente se terá continuado a
interessar pela teoria da relatividade, em boa
parte devido ao poder absoluto das hormonas.
Tirando um ou outro, mais nerd (o conceito não
se usava na altura) com o destino marcado para
seguir para o Técnico (Instituto Superior
Técnico) excitar-se com Física Teórica, os
outros eram rapazes relativamente normais e
estavam mais interessados na “química” com a
rapariga que tinham conhecido no tal baile… E
excitavam-se com isso. Absolutamente. Isto é,
sempre.
Muito mais tarde é que percebi
que o interessava ao Einstein era o absoluto e
não o relativo. Quando publicou a sua teoria, em
1905, nunca lhe chamou “da Relatividade”, nome
que só se viria a utilizar mais tarde, mas sim,
“Electrodinâmica dos corpos em movimento”.
Pois é exactamente a electrodinâmica dos
corpos em movimento que sempre me interessou. A
energia coregráfica fascina-me mais que todos os
mapas do universo. Claramente.