o bom e o bonito (vai ser)

Dizia-me que ia montar um negócio…

Zé Júlio Sardinheiro

"É mais cómodo acreditar no que nos consola. Mais difícil é perseguir a verdade. Pois o verdadeiro não precisa limitar-se ao belo e ao bom. O amigo da verdade não deve pretender paz, calma e felicidade, pois a verdade pode ser muito feia e repulsiva".
(Nietzsche).

Dizia-me que ia montar um negócio…
E eu que às vezes sou moço assim de acintes ao contrário mandei-lhe logo sem pensar: – E eu vou montar um ócio!
A minha leviandade leva-me por vezes para becos-sem-saída ou, para apurar mais a redundância aforística, a meter-me em camisas de onze becos, ou bicos onde uns trazem água e outros apenas um grão de metafísica na asa.
Lembrei-me então que ócio, ao contrário do que muita gente julga, não significa não fazer nada e ficar ali de papo para o ar – embora isso do papo para o ar até possa ser a verdadeira alma do ócio – e não produzir algo que possa contribuir para o PIB e ser tributado pelo valor acrescentado. Não. O ócio é coisa de pensar para além das minudências dos negócios e nem sequer fica logo assim ao alcance directo de quem nada tem para fazer, por estar desempregado.
O verdadeiro ocioso deverá ter a barriga cheia quanto baste, sentir-se reconhecido na sua existência como pessoa, ser capaz de amar e de se deixar amar e estar mais ou menos disponível para se dedicar a uma actividade que lhe pode ocupar a maior parte do tempo… Estão a ver?
Eu não estudei grego e nunca percebi como é que me podia ver grego para entender aquelas palavras feitas de pis, alfas, lambdas, ómegas e rós, mas que felizmente há sempre alguém que translitera isso para algo a que estamos mais habituados.
Há uma palavra grega que podemos escrever skholé que significa “o lugar do ócio” – “o tempo dedicado ao estudo e à meditação”. Em latim, língua onde se chega mais comodamente, temos schola ou scholae. Ócio é o que se devia aprender na escola.
Pois. Vou então montar uma escola de ócio. Preciso dum sócio.
A lassidão do post-prandium costuma ser boa para o ócio. É assim um de papo-para-o-ar frequentemente bastante produtivo e que também é uma grande escola.
Procurar respostas a perguntas pouco comuns tais como:
Como se chamam os irmãos da irmã Lúcia?
De que se alimentava Buda?
Maomé bebia chá de Ceilão?
Que número de sapatos calçava Jesus Cristo?
Dizem-me aqui que isto não tem utilidade nenhuma…
Ah não? Então, seria bom que o demonstrassem!
Agora vou tomar um chá e escutar saturno.